A Comissão para a Igualdade de Género (2009) define a violência como qualquer forma de uso intencional da força, coação ou intimidação contra terceiro/a ou toda a forma de ação intencional que, de algum modo, lese a integridade, os direitos e necessidades dessa pessoa.
Entende-se por violência doméstica “o exercício de força física e de poder sobre outra pessoa, normalmente com o objetivo de a controlar, retirar poder e/ou agredir, que ocorre nos relacionamentos de intimidade, de parentesco, de dependência ou de confiança.” Hoff
A Violência Doméstica engloba todo o tipo de ações, atitudes tomadas para impor flagelos físicos, psicológicos, sexuais, ou financeiros, de modo manifesto ou não, através de ameaças, enganos, coação ou outros meios, a alguém que viva no mesmo agregado familiar ou que, não habitando no mesmo agregado familiar que o agressor, seja ascendente, descendente, colateral, cônjuge ou companheiro marital ou ex-cônjuge ou ex-companheiro marital. A violência doméstica não conhece barreiras geográficas, estratos sociais, faixas etárias, religiões ou etnias.
Pode distinguir-se a Violência Doméstica em sentido estrito, que inclui os atos criminais enquadráveis no art. 152º do Código Penal: maus tratos físicos; maus tratos psíquicos; ameaça; coação; injúrias; difamação e crimes sexuais; e a violência doméstica em sentido lato, que inclui outros crimes em contacto doméstico: violação de domicílio ou perturbação da vida privada; devassa da vida privada (imagens; conversas telefónicas; emails; revelar segredos e factos privados; violência sexual; subtração de menor; violação da obrigação de alimentos; homicídio: tentado/consumado; dano; furto e roubo).
A violência doméstica engloba diferentes tipos de abuso, tais como (APAV):
violência emocional: qualquer comportamento do/a companheiro/a que visa fazer o/a outro/a sentir medo ou inútil. Habitualmente inclui comportamentos como: ameaçar os/as filhos/as; magoar os animais de estimação; humilhar o/a outro/a na presença de amigos/as, familiares ou em público, entre outros.
violência social: qualquer comportamento que tem como objetivo controlar a vida social do/a companheiro/a, impedindo, por exemplo, que este/a visite familiares ou amigos/as, cortar o telefone ou controlar as chamadas e as contas telefónicas, trancar o/a outro/a em casa.
violência física: qualquer forma de violência física que um/a agressor/a inflige ao companheiro/a. Pode traduzir-se em comportamentos como: esmurrar, pontapear, estrangular, queimar, induzir ou impedir que o/a companheiro/a obtenha medicação ou tratamentos.
violência sexual: qualquer comportamento em que o/a companheiro/a força o/a outro/a a protagonizar atos sexuais que não deseja. Alguns exemplos: pressionar ou forçar o/a companheiro/a para ter relações sexuais quando este/a não quer; pressionar, forçar ou tentar que o/a companheiro/a mantenha relações sexuais desprotegidas; forçar o/a outro/a a ter relações com outras pessoas.
violência financeira: qualquer comportamento que intente controlar o dinheiro do/a companheiro(a) sem que este/a o deseje. Alguns destes comportamentos podem ser: controlar o salário do/a outro/a; recusar dar dinheiro ao/a outro/a ou forçá-lo/a a justificar qualquer gasto; ou ameaçar retirar o apoio financeiro, como forma de controlo.
Perseguição: qualquer comportamento que visa intimidar ou aterrorizar o/a outro/a. Por exemplo: seguir o/a companheiro/a para o seu local de trabalho ou quando este/a sai sozinho/a; controlar constantemente os movimentos do/a outro/a, quer esteja ou não em casa.
A Violência Doméstica representa uma grave violação dos direitos humanos. A Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2005, encara a Violência Doméstica como um problema de saúde pública. Portugal, a partir de 2000, considera-a um crime público (Lei 7/2000).
Nesse pressuposto, Portugal tem vindo, ao longo dos anos, a assumir políticas de combate à Violência Doméstica através da implementação de medidas diversas, com o objetivo de conhecer e prevenir o fenómeno; realizar uma intervenção ao nível da proteção e reinserção das vítimas; condenar os/as agressores/as; promover e (re)qualificar os/as profissionais e dotar o país de estruturas de apoio e atendimento, definidas em sucessivos Planos Nacionais contra a Violência Doméstica (PNCVD), nomeadamente o I PNCVD – 1999-2002 (RCM n.º55/1999, de 15 de junho); II PNCVD – 2003-2006 (RCM n.º88/2003, de 7 de julho); III PNCVD – 2007-2010 (RCM n.º83/2007, de 22 de junho); IV PNCVD – 2011-2013 (RCM n.º100/2010, de 17 de dezembro) e V PNCVD – 2014-2017 (RCM n.º 102/2013, de 31 de dezembro).
Estes Planos têm vindo a ser desenvolvidos de acordo com diretrizes europeias e monitorizados por estruturas criadas para o efeito. Os Planos são da responsabilidade da Comissão para a Igualdade de Género e Cidadania (CIG), integrada na Presidência do Conselho de Ministros, sob a tutela do Gabinete da Secretaria de Estado da Igualdade.
A Estratégia Nacional para a Igualdade e a Não-Discriminação – Portugal + Igual (ENIND), publicada na Resolução do Conselho de Ministros n.º 61/2018, de 21 de maio de 2018, refere que a “ENIND pretende consolidar os progressos até agora alcançados e perspetivar o futuro da ação governativa, tendo em vista o desenvolvimento sustentável do país, que depende da realização de uma igualdade substantiva e transformativa, garantindo simultaneamente a adaptabilidade necessária à realidade portuguesa e sua evolução até 2030”.
A preocupação central desta estratégia é a eliminação de estereótipos e preconceitos, no sentido de uma alteração de atitudes e comportamentos sociais, o que implica necessariamente um investimento na informação, sensibilização e educação das comunidades. Esta Estratégia visa atuar de forma consistente contra os estereótipos de género, que originam e perpetuam as discriminações e as desigualdades, com a finalidade de produzir mudanças estruturais duradouras, que permitam alcançar uma real igualdade.
A Estratégia Nacional para a Igualdade e Não Discriminação contempla três Planos de Ação, através de medidas concretas a prosseguir até 2021: o Plano de ação para a igualdade entre mulheres e homens (PAIMH); o Plano de ação para a prevenção e o combate à violência contra as mulheres e à violência doméstica (PAVMVD) e o Plano de ação para o combate à discriminação em razão da orientação sexual, identidade e expressão de género, e características sexuais (PAOIEC).
Portugal reconhece a igualdade e a não discriminação como condição necessária para a construção de um futuro sustentável, enquanto país que realiza efetivamente os direitos humanos e que assegura plenamente a participação de todas e de todos. Neste âmbito, tem priorizado a intervenção ao nível do mercado de trabalho e da educação, da prevenção e combate à violência doméstica e de género, e do combate à discriminação em razão do sexo, da orientação sexual, identidade e expressão de género, e características sexuais, orientado pelos princípios constitucionais da igualdade e da não discriminação e da promoção da igualdade entre mulheres e homens como uma das tarefas fundamentais do Estado (Constituição da República Portuguesa, artigos 13.º e 9.º, alínea h).
Na concretização desta visão, a ENIND assume como central a eliminação dos estereótipos de género enquanto fatores que estão na origem das discriminações diretas e indiretas em razão do sexo, que impedem a igualdade que deve ser garantida às mulheres e aos homens, reforçando e perpetuando modelos de discriminação históricos e estruturais.
As políticas deverão, pois, ter em consideração em todo o processo de planeamento, definição, execução, acompanhamento e avaliação, as especificidades das necessidades, condições e situações das mulheres e dos homens, e as relações hierarquizadas subjacentes. Pretende-se, assim, que a definição das políticas, planos ou programas governamentais ou autárquicos integrem a perspetiva do combate à discriminação em razão do sexo e da promoção da igualdade entre mulheres e homens, e do combate à discriminação em razão da orientação sexual, identidade e expressão de género, e características sexuais (OIEC) em todas as fases.