Numa reunião realizada no dia 4 de abril entre o Presidente da Câmara Municipal, Miguel Costa Gomes, e os acionistas estrangeiros da AdB, “foi estabelecido um acordo prévio de devolução concessão ao Município”, estando em “análise, neste momento, os valores” a ser pagos pela transação, disse Miguel Costa Gomes em conferência de imprensa após a reunião. “Há vontade dos acionistas em negociar a devolução da concessão e há vontade do Município em adquirir esta posição”, frisou o Presidente da Câmara, que vincou a determinação do atual executivo em “privilegiar um acordo para a devolução da concessão”, referindo a necessidade de “zelar pelos interesses do Município e compreender os direitos de um acionista que acreditou e investiu no negócio”. “Estamos a tentar chegar a valores que sejam satisfatórios, quer para uma quer para a outra parte”.
Miguel Costa Gomes referiu ainda que a Câmara Municipal está a analisar o acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte (TCAN) sobre a contestação da Câmara Municipal de Barcelos à decisão do Tribunal Arbitral na ação proposta pela Águas de Barcelos, referente exclusivamente ao pedido de equilíbrio económico financeiro da concessão.
O acórdão, datado de 19 março, concluiu que os incidentes jurídicos ocorridos durante o julgamento em sede de Arbitral, suscitados pelo Município, não constituem matéria suficiente para anular a decisão daquele Tribunal, que condenou o Município a pagar 172 milhões de euros à concessionária.
Este acórdão não interfere com outros processos pendentes, que estão a avaliar as cláusulas do contrato, a sua natureza e consequências para o Município, matéria central levantada pela Inspeção Geral da Administração Local (IGAL) – que encontrou indícios criminais no contrato de concessão, os quais estão a ser investigados pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP).
DCIAP e Ministério Público investigam contrato
Em 2011, a IGAL realizou uma inspeção ao Município de Barcelos tendo analisado este contrato de concessão. No decurso da ação inspetiva, a IGAL apurou um conjunto de factos que são suscetíveis de consubstanciarem a prática de ilícitos de natureza administrativa, contraordenacional e criminal. A inspeção produziu dois relatórios: o relatório principal, que versou sobre os factos praticados na fase do concurso público por parte do Presidente da Câmara em exercício de funções à data e das técnicas do Município de Barcelos que constituíam a comissão de análise das propostas; o relatório parcelar (responsabilidade financeira) foi comunicado na íntegra ao município de Barcelos e versou sobre a responsabilidade financeira do Presidente da Câmara e de alguns vereadores eleitos nos mandatos de 2001 a 2005 e de 2005 a 2009, pelo facto de terem votado favoravelmente duas deliberações da câmara municipal relativas à atribuição de subsídios aos munícipes de Barcelos para custear as ligações às redes públicas de abastecimento de água/saneamento de águas residuais e limpeza de fossas domésticas, no total de 5.780.336€.
A investigação do DCIAP originou um processo crime no âmbito do qual foram constituídos arguidos o anterior presidente da Câmara e uma técnica superior pela prática dos seguintes crimes: falsificação de documento; tráfico e influências; participação económica em negócio e corrupção passiva em ato ilícito.
Os antigos vereadores e duas funcionárias da Câmara Municipal foram constituídas arguidas pelos seguintes crimes: falsificação de documentos e abuso de poder.
Dois administradores e um funcionário da AdB foram constituídos arguidos pela prática do crime de participação económica em negócio.
Na apreciação da minuta do contrato, o IRAR (atual ERSAR) advertiu para que a Câmara Municipal tivesse em atenção as recomendações por si apresentadas e que procedesse à sua revisão. O Município de Barcelos considerou o referido estudo muito detalhado e desenvolvido, encontrando-se, também, definidos os investimentos a realizar (viabilidade económica e financeira), pelo que não acatou as recomendações do IRAR sobre esta matéria.
Auditoria do Tribunal de Contas considera que contrato é “lesivo”
Miguel Costa Gomes lembrou os dois principais erros de todo este processo: o facto do anterior Presidente da Câmara ter abdicado do direito ao recurso e a previsão de consumos de água irrealistas, que o próprio Tribunal de Contas, no relatório da auditoria feita a esta concessão e divulgado em fevereiro passado, considera não ter qualquer sustentação técnica.
Nas considerações finais, este relatório diz que o contrato previa um consumo de água de 126 litros diários por habitante, mas na verdade esse consumo foi de 112 litros; em 2006 o consumo previsto era de 129 litros, mas diminuiu para 90; para 2007 era de 132 litros e o real foi de 81; em 2008 o consumo previsto foi de 135 litros e o real foi de 75; em 2009 a previsão era de 138 litros, mas o consumo real foi de 75 litros.
Ou seja, “o contrato de concessão previa um aumento progressivo do consumo de água, no entanto a realidade indicou uma redução dos mesmos. Ou seja, as previsões apresentadas, pelo Município de Barcelos, a concurso público não foram objeto de um estudo de viabilidade económico-financeira que suportasse os pressupostos técnicos apresentados pela concessionária”.
Por outro lado, diz ainda o relatório nas considerações finais, “não existem evidências de que o concedente (Câmara) tenha auditado ou validado os pressupostos técnicos e financeiros da proposta apresentada pela concessionária no sentido de garantir a consistência e a aderência dos mesmos com a realidade do projeto a contratualizar”.
Mais ainda, “o Município de Barcelos não acautelou as recomendações da ERSAR no sentido de garantir maior objetividade, rigor e transparência quanto às demonstrações financeiras apresentadas pela concessionária”; e “o modelo de partilha de riscos do contrato de concessão mostrou-se desequilibrado e lesivo para o Município de Barcelos”.
E, a terminar, refere o relatório: “Os custos envolvidos com este processo são o reflexo de sucessivas decisões lesivas para os interesses do Município de Barcelos”.